segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Um poeta novo antigo em Quixeramobim

Para Bruno Paulino.

Como a poesia tem mistérios, recebi o livro A menina da chuva, de Bruno Paulino, numa tarde em que o céu estava inchado de nuvens, “bonito para chover”, então segui a menina bailarina de Bruno e tive muita vontade de dançar com ela. Para Adélia Prado, a poesia se dá quando entramos em contato com a transcendência, o que pode acontecer nas miudezas do cotidiano, no trivial que os não poetas não percebem; para o teórico Staiger, o lírico se produz da recordação, ou seja, daquilo que se guarda na “corda do coração”, mas todos concordam que o poeta nos revela o inusitado em linhas encantatórias, seja em verso ou em prosa, não importa. Paulino é um poeta, da linhagem de Rubem Braga e Cecília Meireles, que nos revelavam janelas que o olhar distraído com a superfície das coisas, não vê.

Comoventes os relatos da lembrança da avó e seu altar, tão sertanejo, da espera da menina Alice e suas cores, do menino que descobre o assobio e aprende a conversar com passarinhos; Especial a percepção madura do menino tão novo dos valores que vão sendo esquecidos num mundo mais virtual que real, mais frenético que feliz, longe do tempo das coisas como elas são ou como se dão na emoção, lugar onde vivemos de fato; Rica a leitura de mundo que nos traz, costurando pensamentos de Quintana, imagens de Rubem Braga, um café com Clarice ou a obsessão de Diadorim, enquanto espera a tarde passar por Quixeramobim ou a noite engolir sonhos insones. Poética e autêntica a escrita desse menino antigo, que procura a cidade antiga naquilo que todos guardamos como idílio ou lembrança (nós, os afortunados que ainda cresceram nelas), aquela cidade onde o sino ainda chama, a praça ainda é cheia de olhos por trás das janelas, onde o rio esconde segredos e os poetas se criam entre cachorros e passarinhos.

Vânia Vasconcelos é escritora. Publicou os livros Mergulhos (Crônicas), Desvios                         (Contos), e Chão da Infância (Infantil).

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