Para Bruno Paulino.
Como a poesia tem
mistérios, recebi o livro A menina da chuva, de Bruno Paulino, numa tarde em
que o céu estava inchado de nuvens, “bonito para chover”, então segui a menina
bailarina de Bruno e tive muita vontade de dançar com ela. Para Adélia Prado, a
poesia se dá quando entramos em contato com a transcendência, o que pode
acontecer nas miudezas do cotidiano, no trivial que os não poetas não percebem;
para o teórico Staiger, o lírico se produz da recordação, ou seja, daquilo que
se guarda na “corda do coração”, mas todos concordam que o poeta nos revela o
inusitado em linhas encantatórias, seja em verso ou em prosa, não importa.
Paulino é um poeta, da linhagem de Rubem Braga e Cecília Meireles, que nos
revelavam janelas que o olhar distraído com a superfície das coisas, não vê.
Comoventes os relatos da
lembrança da avó e seu altar, tão sertanejo, da espera da menina Alice e suas
cores, do menino que descobre o assobio e aprende a conversar com passarinhos;
Especial a percepção madura do menino tão novo dos valores que vão sendo
esquecidos num mundo mais virtual que real, mais frenético que feliz, longe do
tempo das coisas como elas são ou como se dão na emoção, lugar onde vivemos de
fato; Rica a leitura de mundo que nos traz, costurando pensamentos de Quintana,
imagens de Rubem Braga, um café com Clarice ou a obsessão de Diadorim, enquanto
espera a tarde passar por Quixeramobim ou a noite engolir sonhos insones.
Poética e autêntica a escrita desse menino antigo, que procura a cidade antiga
naquilo que todos guardamos como idílio ou lembrança (nós, os afortunados que
ainda cresceram nelas), aquela cidade onde o sino ainda chama, a praça ainda é
cheia de olhos por trás das janelas, onde o rio esconde segredos e os poetas se
criam entre cachorros e passarinhos.
Vânia Vasconcelos é
escritora. Publicou os livros Mergulhos (Crônicas),
Desvios (Contos), e Chão da Infância (Infantil).
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